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Vivemos na crença equivocada de que o homem está no centro do mundo. Entretanto, nós, humanos, somos compostos da mais pura matéria-carne-frágil, prestes a se desintegrar em apenas algumas décadas. Qual será o maior e mais encantador mistério
da vida senão o seu próprio fim? E o que dela resta para contar história? Tim Ingold defende, partindo de Heidegger e Deleuze, que o mundo em que habitamos é composto não por objetos, mas por coisas-livres no mundo; que a vida se faz diante
de sua capacidade geradora de relações entre pessoas e coisas, e que reduzir coisas a objetos é ignorar as formas surgidas nos processos vitais de troca. Esses processos vitais de troca, aliás, dialogam com o conceito de intersubjetividade de Vilém Flusser, pelo qual um estar-no-mundo pleno perpassa por se deixar afetar pelo outro – pessoas e
coisas.
As coisas, impregnadas pelo contato daquilo ou de quem com elas se deu, sobreviverão muito mais tempo do que nós mesmos. Elas, as coisas, elas restarão. No fim, tudo se resume aos restos do que um todo qualquer foi um dia e nós sobreviveremos através
das coisas.

Este trabalho tem por objetivo refletir sobre o tempo de uma vida a partir do ponto de vista (aparentemente periférico) das coisas, em contraposição à visão (aparentemente dominante) do homem no centro da narrativa, para investigar a potência vital, a
autonomia e a sobrevida das coisas, e a incontestável contaminação que se verifica na relação entre nós, homens e as coisas-livres, assim entendidas as coisas que ‘acontecem’, que nos ‘arrebatam’, que nos encantam, que nos intrigam e que, uma vez
desnudas e despidas de qualquer caráter funcional que lhes fora anteriormente atribuído, nos olham para, nessa relação genuína de troca, preencher de significado a nossa própria existência.

Ju Jacyntho
As coisas nos olham

Juliana Jacyntho

(1977)

É uma fotógrafa e artista visual brasileira, nascida em Campos dos Goytacazes - RJ. Utiliza a fotografia como principal linguagem
em seus trabalhos, cuja temática central investiga a impermanência, a fugacidade do tempo, o ordinário da vida e das coisas. Desde 2015, integra ateliês e grupos de estudos em São Paulo com intuito de aprofundar a experimentação e debate de seus projetos autorais dedicados à criação fotográfica contemporânea. Atualmente vive e trabalha em São Paulo, e é Mestranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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